sentas-te num banco, abres o invólucro de plástico que protege o pacote das pastilhas, num gesto repetido vezes sem conta.
Procuras pela patilha dourada que te leva ao fio perdido que dá a volta ao pacote e te permite tirar as pastilhas. Envergonhado vais rodando o pacote, tantas vezes que já fizestes isto, mas parecem sempre mudar de sitio, vais rodando até encontrares o que queres.
O sentimento de sucesso só é suplantado pela satisfação de puxares a patilha e veres o fio cortar o plástico em toda a volta. Olhas em volta para meteres o plástico no lixo, e não encontras o caixote. Sorris e metes no bolso.
Abres o pacote e metes a pastilha à boca onde sentes a onda de sabor enquanto mascas devagar e sentes o sabor a crescer cada vez mais. Encostas-te para trás e finalmente observas em teu redor. O banco de jardim é na verdade num centro comercial. Por momento parece que não há covid. As pessoas enchem os centros comerciais enquanto esperam a sua entrada nas lojas.
Sorris porque pensas que são as mesmas pessoas que há seis meses panicavam por papel higiénico e agora estão de máscara em filas sem distanciamento social e tudo para terem uma roupa bonita para irem aos funerais, como convidado ou como festeiro.
A vida tem de continuar dizem.
Até eu fui apanhado, não mais tempo do que o necessário nestes saldos manhosos, temos de refletir que mundo queremos para os nossos filhos quando arriscamos uma infeção em troca de roupas mais baratas.
O que te devolve o espelho quando te confrontas com a verdade, o que dizem os teus olhos no reflexo? Talvez um silêncio constrangedor ou talvez um sorriso que afaga o ego.
Quem és tu neste novo mundo??